Estava eu refletindo sobre alguns dados que mostram o aumento crescente dos investimentos em segurança publica no Brasil e não pude deixar der associar tal situação, principalmente, a um período histórico específico. Vejamos primeiro os dados para depois falarmos do período histórico a que me refiro. De acordo com um estudo sobre o assunto publicado na folha online, em todo o ano de 2007 foram investidos no Brasil R$ 35 bilhões em segurança pública pelos Estados e pelo governo federal -13% a mais que o volume aplicado em 2006-, mostra a segunda edição do "Anuário Estatístico do Fórum Brasileiro de Segurança Pública". De acordo com a publicação, São Paulo foi o Estado que mais investiu recursos na área -R$ 7,61 bilhões.
Mesmo considerando que tais investimentos são imprescindíveis no momento histórico pelo qual estamos passando, não posso deixar de considerar que seria muito melhor se essa montanha de dinheiro pudesse ser investida em educação. Se isso já tivesse sendo feito há muito tempo, com certeza a situação do Brasil agora seria bem diferente, não precisando de investimentos tão vultosos na área de segurança publica. Mas, estamos pagando essa divida por causa de um passado de irresponsabilidades e descasos na área de educação. A formula não é tão complicada, pois vemos os casos de Países como a Coréia do Sul que, quando passaram a ver a educação como prioridade, tiveram resultados expressivos com crescimentos econômicos altíssimos e sustentáveis.
No Brasil, os políticos sempre utilizaram a retórica de que o investimento em educação teria uma atenção especial em seus respectivos governos. Entretanto, o passar dos anos mostra que estamos caminhando a passos lentos nesse sentido, pois as promessas tornam-se palavras vãs diante de um desafio de tamanha monta. Sabemos que o nosso país é muito mais complexo que a coréia do Sul e outros países que encararam tamanho desafio de frente, mas sabemos também que só seremos uma nação desenvolvida se resolvermos essa pendência.
A primeira herança negativa que nos foi legada é aquela advinda do tipo de colonização implantada por Portugal em nosso território. Para os portugueses a educação, tinha uma importância secundária. Fazendo uma comparação com as colônias hispânicas, observamos que enquanto nessas colônias já existiam muitas universidades, sendo que em 1538 já existia a Universidade de São Domingos e em 1551 a do México e a de Lima, a primeira Universidade brasileira só surgiu em 1934, com a criação da USP em São Paulo, ou seja, enquanto o “Brasil” foi colônia de Portugal, jamais fora implantada uma universidade em nosso território. Isso, sem duvida, não poderia deixar de ter um reflexo negativo importante para o desenvolvimento da educação brasileira.
Na minha opinião, no entanto, o período que deixou marcas indeléveis legando para a posteridade uma situação caótica e de difícil equação foi sem, sem duvida alguma, aquele dominado pelos militares, ou seja, o intervalo compreendido entre 1964 e 1985. Quando os militares empreenderam o golpe de estado em 31 de março de 1964, gestava-se uma revolução na educação brasileira, principalmente com Paulo Freyre e o seu método de alfabetização dos trabalhadores em quarenta dias. Ela já havia logrado um grande êxito e tencionava expandir a sua forma de ensinar pelo Brasil inteiro. Paulo Freyre, no entanto, queria formar cidadãos capazes de fazer uma leitura critica do mundo e da sociedade que o circunda. Ele queria trabalhadores politizados e não se restringia, por isso mesmo, a apenas alfabetizá-los. Uma sociedade critica e politicamente ativa, entretanto, não interessava ao novo regime.
Quando os militares tomaram o poder, muitos professores foram presos e demitidos; universidades foram invadidas; estudantes foram presos e feridos, nos confronto com a polícia, e alguns foram mortos; os estudantes foram calados e a União Nacional dos Estudantes foi proibida de funcionar. Ao assumir o governo, o discurso dos militares era de que o regime tencionava construir um sistema de ensino que fosse capaz de aplacar a pobreza no Brasil, diminuindo a desigualdade social. Como diminuir a desigualdade num modelo de desenvolvimento econômico que priorizava o enriquecimento da camada mais rica da população? Essa pergunta não encontrou resposta nos planejamentos educacionais desenvolvidos entre 1964 e 1985.
Os militares buscavam a sua hegemonia no poder e pregavam muitos dos seus ideais nos meios educacionais. Para isso, buscavam também apoio de parte da sociedade baseado no seu projeto de desenvolvimento econômico. Nesse sentido, divulgou conceitos produzidos pela Escola Superior de Guerra nos manuais de Estudos dos Problemas Brasileiros, instrumentalizando os privilegiados que tinham acesso ao ensino superior no combate aos “inimigos internos”, na “defesa da Pátria” e na “preservação dos valores nacionais”. Nesse período para erradicar o analfabetismo foi criado o Movimento Brasileiro de Alfabetização – MOBRAL, aproveitando-se, em sua didática, do expurgado Método Paulo Freire. O MOBRAL propunha erradicar o analfabetismo no Brasil, mas passou longe de conseguir o seu intento. E diante das denúncias de corrupção, entre outras, acabou por ser extinto e, no seu lugar criou-se a Fundação Educar.
Obviamente não faltaram criticas às sucessivas e malsucedidas investidas do governo militar no setor de educação, no entanto, qualquer forma de discordância era logo taxada de “subversiva” ou “comunista” e seu autor era banido dos meios acadêmicos. O movimento estudantil sofreu muitas baixas até que perdeu sua força, mantendo-se quase inerte nos anos mais truculentos da ditadura. Essa foi a outra forma de educar encontrada pelo regime: disseminando o terror, para desencorajar atitudes de apoio aos “subversivos” ou “comunistas”.
Resumindo, após 21 anos de ditadura militar, restou ao Brasil um sistema educacional com graves problemas: uma estrutura física que, apesar de estendida, não foi suficiente para atender à demanda crescente; uma queda na qualidade do ensino superior, com a proliferação de “empresas educacionais” que permitiram o acesso de um pequeno contingente das camadas de menores níveis de renda ao ensino superior, contingente este que custeava seus próprios estudos; queda na qualidade dos níveis elementares de ensino, dada a queda na qualidade de formação dos profissionais de educação, além da depreciação das condições de trabalho desses profissionais.
A tudo isso, deve-se somar ainda o pesado tributo deixado pela caótica situação social advinda dessa política de descaso com a educação, o que acaba por gerar como contrapartida obvia um aumento sem precedentes nos investimentos com segurança publica, sendo esses superiores, paradoxalmente, aos investimentos no setor educacional. É claro que existem outros fatores como desemprego, entre outros, que incidem decisivamente no aumento dos índices de violência, mas se tivesse havido mais seriedade e vontade política com a educação, o cenário nos seria muito mais favorável agora.
Francisco Lima
Um comentário:
Todos nós sabemos de cor que não existe desenvolvimento sem educação,mas a corrupção, que sempre grassou o nosso país, tem sido uma barreira para esse mesmo desenvolvimento.
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