O estado e as comunidades carentes
Estava vendo um vídeo de uma reportagem sobre uma festa promovida pelo tráfico numa favela em Diadema, São Paulo e observei que no evento em questão havia de tudo em abundancia, desde carne e cerveja até drogas como cocaína e maconha que eram servidos “self-service”. Um promotor de justiça disse que os promotores da festa tentavam vender a imagem de que o poder público esteve sempre ausente e que eles (os traficantes) é que ocupariam esse vazio deixado por essa ausência. Cabe-nos então uma pergunta: será que o estado está sempre presente, da maneira que deveria, nessas localidades? Gostaria muito de responder positivamente a esse questionamento, mas infelizmente a realidade me impede de fazê-lo. É notória a ausência do poder público na maioria das comunidades carentes e quando sua presença é sentida geralmente é o aparelho policial que se faz presente e quase sempre de forma coercitiva e com uso abusivo da violência e, não raro, fazendo vítimas inocentes nessa guerra sem fim.
Pensando um pouco nessa questão da violência policial me veio à cabeça um conceito que é muito debatido nos meios acadêmicos e que eu não pude deixar de associá-lo ao que acontece nessa relação policia ou Estado x comunidades carentes. Refiro-me à legitimidade e acho que muitas das vezes esta relação pautada na violência não cria a empatia e outros elementos necessários para tornarem o laço entre essas comunidades e o estado algo duradouro, sendo que na maior parte das vezes o estado está personalizado no aparelho policial, pois sabemos que nesses locais a falta infra-estrutura, de saneamento básico, educação e saúde de boa qualidade entre outras coisas fazem com que essas populações se sintam abandonadas pelo estado. De acordo com o etnólogo Frances Georges Balandier: “O poder estabelecido unicamente sobre a força ou sobre a violência não controlada teria uma existência constantemente ameaçada [...] ele só se realiza e conserva pela transposição, pela produção de imagens, pela manipulação de símbolos e sua organização em um quadro cerimonial”. Pelo exposto, nota-se que é urgente que o estado mude a sua imagem junto a essas populações.
Em muitas comunidades cariocas a ausência do estado criou mitos em torno da figura de muitos traficantes que souberam manipular habilmente o imaginário do povo e ao mesmo tempo estavam presentes nos momentos mais difíceis, socorrendo-os nas mais diversas necessidades. Dois exemplos disso são os traficantes Tonicão e Jorge Luis, ambos da favela de Acari e que comandaram o trafico de drogas naquela região na metade dos anos noventa. O primeiro teria entrado para o trafico por ter visto a sua família assassinada pela policia e quando se tornou chefe, segundo os moradores, botou moral na favela. Os “viciados” tinham o seu local próprio (dentro mato) para consumir a droga e, se alguém fosse pego urinando perto de senhoras sofreria uma punição rigorosa. Ele tinha o costume também passear pela comunidade mandando as crianças irem para a escola, chamando atenção dos pais, obrigando-os a fazer a matricula dos seus filhos com punições em caso de reincidência e dissolvia rodinhas de bate-papo formadas por mulheres alegando que ali “era o nascedouro de todas as fofocas. Não admitia, em hipótese alguma, crianças trabalhando no tráfico e promovia festas para os moradores em datas festivas. Por essas e outras razões, tornou-se uma unamidade entre os moradores que não o consideravam bandido, pois ele só fazia que fosse justo e correto de acordo com a opinião de toda a comunidade. Jorge Luis, que o sucedera adotou a mesma linha de atuação e, segundo consta, era enfermeiro, mas reza a lenda que ele se revoltou e entrou para o tráfico porque um dia, quando saía de madrugada de casa para o trabalho, foi parado pela polícia e tomou várias tapas na cara. Ele não conseguiu a mesma notoriedade do seu antecessor e ex-chefe, mas a sua política assistencialista deixa muitos moradores de Acari saudosos “dos tempos do Jorge Luis”.
O relatado acima se repete em muitas outras comunidades e esses chefes acabam se legitimando por criarem historias que dão conta da fatalidade que envolve suas vidas. Isto é, eles acabaram entrando para o trafico sempre motivados por uma ou outra circunstancia que quase sempre está associada à violência policial. Eles tiveram “motivos justos” para entrar para a atividade criminosa. Nesse sentido, passam a ser vistos não mais como criminosos e sim como alguém que “foi obrigado” a seguir esse caminho para fazer justiça. A ausência do estado e a violência policial acabam sendo habilmente utilizadas por esses chefes, que se apresentam como justos e corretos, satisfazendo, na medida do possível, algumas necessidades básicas dessa população carente de quase tudo. Assim, catalisam a seu favor todo o descaso de um estado omisso e o despreparo de uma policia que tenta se impor pela violência. Com certeza, não é esse o caminho e é necessária a busca de outra estratégia com urgência.
Estava vendo um vídeo de uma reportagem sobre uma festa promovida pelo tráfico numa favela em Diadema, São Paulo e observei que no evento em questão havia de tudo em abundancia, desde carne e cerveja até drogas como cocaína e maconha que eram servidos “self-service”. Um promotor de justiça disse que os promotores da festa tentavam vender a imagem de que o poder público esteve sempre ausente e que eles (os traficantes) é que ocupariam esse vazio deixado por essa ausência. Cabe-nos então uma pergunta: será que o estado está sempre presente, da maneira que deveria, nessas localidades? Gostaria muito de responder positivamente a esse questionamento, mas infelizmente a realidade me impede de fazê-lo. É notória a ausência do poder público na maioria das comunidades carentes e quando sua presença é sentida geralmente é o aparelho policial que se faz presente e quase sempre de forma coercitiva e com uso abusivo da violência e, não raro, fazendo vítimas inocentes nessa guerra sem fim.
Pensando um pouco nessa questão da violência policial me veio à cabeça um conceito que é muito debatido nos meios acadêmicos e que eu não pude deixar de associá-lo ao que acontece nessa relação policia ou Estado x comunidades carentes. Refiro-me à legitimidade e acho que muitas das vezes esta relação pautada na violência não cria a empatia e outros elementos necessários para tornarem o laço entre essas comunidades e o estado algo duradouro, sendo que na maior parte das vezes o estado está personalizado no aparelho policial, pois sabemos que nesses locais a falta infra-estrutura, de saneamento básico, educação e saúde de boa qualidade entre outras coisas fazem com que essas populações se sintam abandonadas pelo estado. De acordo com o etnólogo Frances Georges Balandier: “O poder estabelecido unicamente sobre a força ou sobre a violência não controlada teria uma existência constantemente ameaçada [...] ele só se realiza e conserva pela transposição, pela produção de imagens, pela manipulação de símbolos e sua organização em um quadro cerimonial”. Pelo exposto, nota-se que é urgente que o estado mude a sua imagem junto a essas populações.
Em muitas comunidades cariocas a ausência do estado criou mitos em torno da figura de muitos traficantes que souberam manipular habilmente o imaginário do povo e ao mesmo tempo estavam presentes nos momentos mais difíceis, socorrendo-os nas mais diversas necessidades. Dois exemplos disso são os traficantes Tonicão e Jorge Luis, ambos da favela de Acari e que comandaram o trafico de drogas naquela região na metade dos anos noventa. O primeiro teria entrado para o trafico por ter visto a sua família assassinada pela policia e quando se tornou chefe, segundo os moradores, botou moral na favela. Os “viciados” tinham o seu local próprio (dentro mato) para consumir a droga e, se alguém fosse pego urinando perto de senhoras sofreria uma punição rigorosa. Ele tinha o costume também passear pela comunidade mandando as crianças irem para a escola, chamando atenção dos pais, obrigando-os a fazer a matricula dos seus filhos com punições em caso de reincidência e dissolvia rodinhas de bate-papo formadas por mulheres alegando que ali “era o nascedouro de todas as fofocas. Não admitia, em hipótese alguma, crianças trabalhando no tráfico e promovia festas para os moradores em datas festivas. Por essas e outras razões, tornou-se uma unamidade entre os moradores que não o consideravam bandido, pois ele só fazia que fosse justo e correto de acordo com a opinião de toda a comunidade. Jorge Luis, que o sucedera adotou a mesma linha de atuação e, segundo consta, era enfermeiro, mas reza a lenda que ele se revoltou e entrou para o tráfico porque um dia, quando saía de madrugada de casa para o trabalho, foi parado pela polícia e tomou várias tapas na cara. Ele não conseguiu a mesma notoriedade do seu antecessor e ex-chefe, mas a sua política assistencialista deixa muitos moradores de Acari saudosos “dos tempos do Jorge Luis”.
O relatado acima se repete em muitas outras comunidades e esses chefes acabam se legitimando por criarem historias que dão conta da fatalidade que envolve suas vidas. Isto é, eles acabaram entrando para o trafico sempre motivados por uma ou outra circunstancia que quase sempre está associada à violência policial. Eles tiveram “motivos justos” para entrar para a atividade criminosa. Nesse sentido, passam a ser vistos não mais como criminosos e sim como alguém que “foi obrigado” a seguir esse caminho para fazer justiça. A ausência do estado e a violência policial acabam sendo habilmente utilizadas por esses chefes, que se apresentam como justos e corretos, satisfazendo, na medida do possível, algumas necessidades básicas dessa população carente de quase tudo. Assim, catalisam a seu favor todo o descaso de um estado omisso e o despreparo de uma policia que tenta se impor pela violência. Com certeza, não é esse o caminho e é necessária a busca de outra estratégia com urgência.
Um comentário:
A CORRUPÇÃO POLICIAL OS EQUIPARA AOS BANDIDOS. O PIOR DISSO TUDO É QUE ELES SÃO PAGOS PARA NOS DAR SEGURANÇA. ESTAMOS SEM ALTERNATIVA E SE NÃO HOUVER UMA MUDANÇA URGENTE NÃO ATÉ ONDE CHEGAREMOS.
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